Trabalhei em duas cooperativas Agrícolas uma em S.Vicente de Valongo (Unidade Colectiva de Produção Agrícola Povo Unido) a outra em Nossa Senhora de Machede (Unidade Colectiva de Produção Agrícola 25 de Abril)
Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP, Casa do Alentejo, Lisboa, Sessão Comemorativa do 30º aniversário da publicação da primeira edição do romance «Levantado do Chão»
Jerónimo de Sousa na Sessão Comemorativa do 30º aniversário do romance «Levantado do Chão» de José Saramago
Quinta 4 de Novembro de 2010
Intervenção de Jerónimo de Sousa na Sessão Comemorativa dos 30 anos da lançamento de "Levantado do Chão" de José Saramago.
Assinalamos hoje, aqui, o 30º aniversário do lançamento da primeira edição daquele que é um, incontestavelmente, dos grandes romances da Literatura Portuguesa: «Levantado do Chão», de José Saramago – escritor de dimensão internacional, Prémio Nobel da Literatura, militante do Partido Comunista Português.
Referindo a militância comunista do camarada José Saramago, o que quero sublinhar é que o romance, cuja data de publicação aqui comemoramos, bem como toda a obra literária do Autor, estão indissociavelmente ligados à sua condição de comunista. Com efeito, sem essa condição, a obra de José Saramago, independentemente do singular talento do autor, não seria exactamente o que é; as massas humanas que povoam os seus livros – e de forma flagrante no «Levantado do Chão» – seriam outras, seguiriam outros caminhos, acalentariam outros sonhos, transportariam outros projectos e não seriam, como são, protagonistas activos do incessante movimento da história.
Foi assumindo essa condição que José Saramago afirmou que, para conquistar o Prémio Nobel, não deixou de ser comunista – afirmação clara e inequívoca e que assume maior relevância e actualidade neste tempo em que assistimos à descredibilização dos «nobeis», por efeito de atribuições que constituem autênticas peças da intensa operação ideológica anticomunista em curso.
Por isso, vale a pena sublinhar que, não esquecendo a importância que o Prémio teve para José Saramago e a imediata projecção planetária que lhe deu, é importante não esquecer, também, que a obra literária do grande escritor José Saramago, tivesse ou não tivesse o seu autor sido galardoado com o Prémio Nobel, constituiria sempre um marco maior da literatura mundial – e vale a pena relembrar, ainda, que a atribuição do importante galardão ao autor de «Levantado do Chão» foi altamente prestigiante para o próprio Prémio.
«Levantado do Chão» é um romance épico que nos fala da saga heróica do proletariado agrícola do Alentejo, organizado no seu partido de classe, o PCP, rumo à conquista do seu sonho maior, da sua aspiração mais sentida, do seu querer mais forte: a Reforma Agrária, com a entrega da terra a quem a trabalha.
Neste livro está presente a memória de décadas e décadas de luta:
a luta corajosa, permanente, tenaz, dos assalariados agrícolas do Alentejo e do Ribatejo contra o regime fascista e o latifúndio, que era um dos seus sustentáculos fundamentais.
Luta travada por homens e mulheres que, enfrentando a violência e a brutalidade fascistas com uma elevada consciência de classe e política, e sempre violentamente reprimida pelo fascismo – com as perseguições, as prisões, as torturas, os assassinatos, casos de Catarina Eufémia, em Baleizão, em 1954 e de José Adelino dos Santos, em Montemor-o-Novo, em 1958 – constituiu dos momentos mais altos da longa e heróica resistência dos trabalhadores e do povo ao português ao fascismo.
Luta, muitas vezes, conduzindo a vitórias memoráveis, como aconteceu com a histórica conquista das oito horas de trabalho, em Maio de 1962, e que este magnífico «Levantado do Chão» sinaliza admiravelmente.
Luta que, pouco a pouco, foi lançando nos campos do latifúndio opressor e explorador, as sementes que, com Abril, viriam a florir na mais bela conquista da nossa Revolução.
Luta que continuou, em novos moldes, no processo de construção da Reforma Agrária, com a decisão histórica dos trabalhadores de avançarem para as terras, ocupando-as e cultivando-as, numa altura em que a sabotagem económica levada a cabo pelos grandes agrários punha em perigo a liberdade e a democracia acabadas de conquistar – e que, pouco mais de um ano passado, tinha mais de um milhão de hectares de terra a produzir como nunca antes acontecera; eliminara o flagelo do desemprego com a criação de 50 mil postos de trabalho; e criara nas centenas de Unidades Colectivas de Produção – essas estruturas de novo tipo nascidas da criatividade revolucionária dos trabalhadores – novas relações de produção, de cooperação e de solidariedade que, naquele universo e naquela situação concreta, significaram o fim da exploração do homem pelo homem.
Luta que, posteriormente, teve que enfrentar a ofensiva destruidora e criminosa das hordas contra-revolucionárias, num Alentejo outra vez a ferro e fogo, outra vez com a repressão e a violência à solta.
Quando o «Levantado do Chão» foi publicado, essa ofensiva contra a Reforma Agrária estava no seu início: estava em curso o processo devastador que, iniciado pelo primeiro Governo PS/Mário Soares, seria prosseguido por sucessivos governos dos três partidos da contra-revolução, PS, PSD e CDS – governos, todos eles recorrendo ostensivamente ao golpe e à ilegalidade; todos eles ordenando os roubos de terras, de colheitas, de alfaias, de máquinas, de gados; todos fora da lei, violando a Constituição da República Portuguesa e rasgando insolentemente centenas de decisões favoráveis à Reforma Agrária emitidas pelos tribunais; todos eles, pela sua política, fazendo ressurgir a tríade de negra memória composta pelos grandes agrários, pelos governos e pelas forças repressivas; todos eles levando outra vez ao Alentejo o desemprego, a miséria, a desertificação, as cercas de arame farpado guardando campos que não produzem – todos eles levando outra vez ao Alentejo as perseguições, os espancamentos, os julgamentos sumários, as prisões e, também à semelhança do tempo do fascismo, não hesitando em recorrer ao assassinato, como nos casos de José Geraldo Caravela e do jovem António Maria Casquinha.
Foram catorze longos anos de resistência, catorze longos anos de acção em defesa da mais bela conquista da Revolução, numa luta que teve como protagonistas milhares de homens, mulheres e jovens de Abril, aos quais milhares de trabalhadores de todo o País prestaram a sua solidariedade de classe. Foi, enfim, todo o povo da Reforma Agrária: esse povo levantado do chão e olhando de frente o futuro.
E o que ressalta desta experiência memorável, em que, pela primeira vez na história, os proletários agrícolas do Sul foram donos e senhores do seu destino, é que no futuro democrático de Portugal, a Reforma Agrária é uma necessidade incontornável e que lutar por ela é lutar pela democracia, pela liberdade, pela justiça social, pelo progresso, pela independência e soberania nacionais.
Desta epopeia grandiosa e heróica, feita de coragem e determinação, de convicção e esperança, de confiança e de certeza, emerge, como ensinamento fundamental para os dias de hoje, a importância decisiva e a indispensabilidade da luta: a ideia fulcral de que lutar vale sempre a pena; de que a luta é o caminho para o futuro – sejam quais forem as circunstâncias existentes, sejam quais forem as consequências e seja qual for o resultado imediato da luta – assim confirmando que se é verdade que quem luta, nem sempre ganha, mais verdade é que quem não luta, perde sempre.
Ensinamento que nos dias que vivemos assume particular relevância, dada a força da actual ofensiva ideológica do grande capital veiculada profusamente pelos média de que é proprietário, e procurando vender, em embalagens cheias de enfeites perversos, as teses do conformismo, da passividade, das inevitabilidades, da inutilidade da luta. Uma ofensiva que é complementada e complementa, o clima de intimidação, de chantagem, de represálias, existente em milhares de empresas, onde o grande capital, com a luz verde dos seus governos e sempre à margem da lei, acentua e intensifica a exploração, espezinhando e violando a Constituição da República Portuguesa, afrontando a democracia de Abril, os seus princípios e os seus valores essenciais.
Ensinamento que nos tempos de hoje tem tanto mais valor quanto são os trabalhadores, as suas organizações de classe, o seu Partido de classe, a resgatar o valor da luta, decidindo-a e fazendo-a. Decidindo-a e concretizando-a com a plena consciência da relação de forças que lhes é desfavorável, com a lucidez que decorre da análise da ofensiva, da sua envergadura, dos seus objectivos. Mas também sabemos que, num quadro de agudização da luta de classes, o conformismo não só não resolve como agrava a ofensiva e a exploração. E que, em determinados momentos históricos, resistir é já vencer.
Eis pois o ensinamento e a lição que os trabalhadores em muitas empresas estão a dar, que os trabalhadores da Administração Pública vão dar no dia 6, que as forças da Paz e contra a NATO vão dar no dia 20, que os trabalhadores portugueses vão afirmar na Greve Geral do dia 24 de Novembro – Levantados do Chão!, bem podia ser o lema destas lutas todas.
Ao partido dos trabalhadores o que se exige é mais do que ser solidário com a luta. Ao PCP o que se coloca é mobilizar, organizar, participar e intervir politicamente em todos os espaços onde seja preciso travar combates.
Como é, por exemplo, a intervenção da nossa candidatura às presidenciais convocados que estamos para, ombro a ombro com o nosso candidato, o camarada Francisco Lopes, participarmos numa batalha que não deve nem pode ser dissociada da luta pela ruptura e pela mudança, pela defesa dos direitos dos trabalhadores, pela afirmação do nosso projecto de transformação social.
No remate do seu livro «Levantado do Chão», José Saramago afirmou designadamente:
«Do chão sabemos que se levantam as searas e as árvores, levantam-se os animais que correm os campos ou voam por cima deles levantam-se os homens e as suas esperanças. Também do chão pode levantar-se um livro, como uma espiga de trigo ou uma flor brava. Ou uma ave. Ou uma bandeira.»
Com o risco do acrescento afirmamos nós:
Mesmo que nos tombem voltaremos a erguer-nos, que outros se erguerão nesta dura e fascinante caminhada de transformar a vida.
Extraido do site do: Partido Comunista Português
Reforma Agrária da utopia à realidade Lino de Carvalho conta história da Reforma Agrária Por São José Almeida Trinta anos depois do 25 de Abril, Lino de Carvalho decidiu fazer o registo sistematizado da Reforma Agrária e dar-lhe o título de "Reforma Agrária Da Utopia à Realidade", volume editado pela Campo de Letras, na colecção Campo da História, que amanhã é formalmente lançado na Livraria Parlamentar, na Assembleia da República, depois de um primeiro lançamento no passado dia 5, em Évora, cidade pela qual é eleito deputado à Assembleia da República desde 1987. |
Vice-presidente da Assembleia da República, enquanto deputado pelo PCP - de que é militante desde de 1969 e cujo Comité Central integra desde Dezembro de 1988 -, Lino de Carvalho tem, nos últimos 17 anos, dedicado-se às questões relacionadas com a agricultura e as políticas e estratégias agrícolas ou ausência delas em Portugal. A sua mais recente área de intervenção parlamentar, no capítulo agrícola, foi precisamente a defesa de políticas de incentivo à exploração agrícola do perímetro de rega da Barragem do Alqueva, sendo o responsável pelo projecto de lei do PCP que procurou instituir um "banco de terras" estatal para arrendamento e um limite máximo de extensão da propriedade na zona. |
Contribuição do município de Évora |
Abílio Dias Fernandes
É oportuno assinalar que a cidade de Évora tem tido uma dimensão política relevante ao longo de toda a história de Portugal. Chegou a ser a segunda cidade do reino, com longas permanências da corte real, nos séculos XV e XVI e nela foi fundada a segunda universidade do país. Situada numa zona de latifúndio e de culturas extensivas, nela se concentrou, desde cedo, o poder dos lavradores terra-tenentes, com grande influência na governação do país, até ao final do regime fascista.
Foi precisamente na região que tem Évora como centro, o Alentejo, que com a Revolução do 25 de Abril se deu uma das maiores transformações da sociedade portuguesa: a Reforma Agrária (RA). Foram afastados os proprietários latifundiários e as terras foram ocupadas e geridas autonomamente pelo operariado agrícola, sob a forma de Unidades Colectivas de Produção (UCPs) e Cooperativas.
Auto-gerindo a sua força de trabalho e os meios de produção, os assalariados rurais realizaram 12 Conferências da RA onde debatiam os seus problemas organizacionais e as orientações gerais de programação das produções e diversidade de culturas, empenharam-se em grandes jornadas de trabalho solidário, implementaram a igualdade salarial entre homens e mulheres, criaram estruturas de apoio à criança no mundo rural, criaram cooperativas de consumo, iniciaram o escoamento dos seus produtos criando, em Évora, com o apoio da autarquia, um mercado da Reforma Agrária. Entretanto, conseguiram as maiores produções de sempre na região, com 70.000 trabalhadores organizados em 550 unidades de produção que ocuparam cerca de 1.150.000 ha., pouco mais de um terço do total da área agrícola da zona de intervenção que a legislação contemplou como passível de ser “nacionalizada”.
A contra-revolução e o retrocesso da vivência democrática
Sucessivos governos do Partido Socialista (PS) e do Partido Social-democrata (PSD), durante mais de 10 anos produziram legislação gravosa e normativos avulsos e casuais que foram retirando aos trabalhadores as melhores terras, gados, meios de produção e colheitas, entregando-os aos antigos latifundiários, até asfixiarem completamente a Reforma Agrária, uma das mais belas conquistas de Abril.
Em Évora, enquanto no fascismo o poder administrativo era exercido e totalmente influenciado pelos proprietários das terras, a partir da Revolução de Abril passou a ser exercido por eleitos em sufrágio universal e directo, constituindo o Poder Local Democrático, outra grande conquista da Revolução dos Cravos.
Viva a Reforma Agrária
|